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Resolução do Provedor de Justiça Europeu sobre a queixa 163/99/IP contra a Comissão Europeia


Índice


Estrasburgo, 19 Outubro 2000

Excelentíssimo Senhor,
A 8 de Fevereiro de 1999, apresentou V. Ex.ª ao Provedor de Justiça uma queixa em nome da "Associação dos Espoliados de Angola" (de ora em diante designada AEANG), contra a Comissão Europeia. A queixa dizia respeito ao alegado não cumprimento por parte da Comissão Europeia de certas obrigações legais nos termos da 4ª Convenção de Lomé (de ora em diante designada a Convenção) e à ausência de resposta à sua correspondência.
A 8 de Março de 1999, enviei a queixa ao Presidente da Comissão Europeia. Em 31 de Maio de 1999, a Comissão enviou a tradução em português do seu parecer, que eu remeti a V. Ex.ª , convidando-o a apresentar observações, caso o desejasse. A 15 de Julho de 1999, recebi as suas observações ao parecer da Comissão.
Por forma a clarificar determinados aspectos da queixa, solicitei-lhe informações suplementares a 28 de Fevereiro de 2000. V. Ex.ª enviou-me as informações solicitadas a 16 de Março de 2000.
Escrevo-lhe agora para informar V. Ex.ª dos resultados dos inquéritos realizados.

A QUEIXA


A AEANG é uma associação de defesa dos interesses dos cidadãos portugueses que, durante o processo de independência, foram forçados a abandonar a ex-colónia portuguesa de Angola e que, consequentemente, se viram privados das suas propriedades nesse país.
O queixoso salientou que o Governo português realizou alguns acordos com o Governo angolano que previam a indemnização dos cidadãos que haviam sofrido perdas financeiras. Contudo, as autoridades angolanas não terão respeitado esses acordos e todas as relações foram, consequentemente, interrompidas.
Foi neste contexto que o queixoso apresentou uma queixa à Comissão Europeia dos Direitos do Homem contra o Governo português, afirmando que este não tinha protegido os interesses dos membros da AEANG.
Uma vez que a Comissão Europeia dos Direitos do Homem declarou este caso como não sendo admissível, já que não preenchia os requisitos de admissibilidade, o queixoso escreveu à Comissão Europeia sobre a mesma questão, em Março de 1998, solicitando que esta instituição tomasse medidas contra Portugal. A 16 de Junho de 1998, os serviços da Comissão acusaram a recepção da carta do queixoso e informaram-no de que, devido à complexidade do caso, seria necessário algum tempo para o analisar. Nesta carta, a Comissão afirmava que o queixoso poderia contactar o funcionário responsável pelo caso para obter quaisquer explicações suplementares.
A 8 de Fevereiro de 1999, o queixoso apresentou uma queixa ao Provedor de Justiça Europeu contra a Comissão Europeia. Na sua carta, afirmava que a Comissão não tinha cumprido as suas obrigações legais que lhe incumbem por força da Convenção e que não tinha respondido à sua correspondência.

O INQUÉRITO


O parecer da Comissão
Os comentários da Comissão Europeia relativamente à queixa são, resumidamente, os seguintes:
No que diz respeito ao alegado incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força da Convenção, a Comissão salientou que os acontecimentos relatados pelo queixoso datam de 1975, ou seja, antes de Angola passar a estar vinculada pela Convenção de Lomé. A Comunidade pode utilizar o artigo 5º da Convenção de Lomé IV (que se refere ao respeito pelos direitos humanos em geral), apenas sob certas condições, nos termos do artigo 366º-A da Convenção. Contudo, esta possibilidade não existe para acontecimentos situados em 1975, data em que Angola não estava ainda vinculada à Convenção e em que esta cláusula ainda não existia.
Para além disso, a Comissão salientou que a expropriação de bens pertencentes a cidadãos estrangeiros e a respectiva compensação são matérias que são regidas primordialmente pela legislação nacional de Angola. Assim sendo, as pessoas cujos bens tenham sido expropriados num país estrangeiro devem, consequentemente, solicitar uma compensação nesse país. Só após estarem esgotadas as vias legais de recurso ao nível nacional é que podem solicitar a intervenção diplomática do seu próprio país.
Quanto à ausência de resposta à correspondência do queixoso, a Comissão salientou que tinha sido enviada uma carta ao Comissário Pinheiro, em 18 de Março de 1998, tendo sido dada uma resposta a 16 de Junho de 1998. Nesta carta, a Comissão explicava que, devido à sua complexidade, o caso estava ainda a ser considerado e convidava o queixoso a enviar à Comissão outras informações relevantes. A instituição afirmava que, como não tinha sido dado seguimento ao convite, a manutenção de correspondência subsequente tinha sido considerada desnecessária.
Observações do queixoso
O Provedor de Justiça enviou ao queixoso o parecer da Comissão e convidou-o a formular observações.
No que diz respeito à ausência de resposta da Comissão às suas cartas, o queixoso afirmou que havia endereçado várias cartas a diferentes Comissários, incluindo o Presidente da Comissão Europeia, não tendo obtido qualquer resposta. A única resposta recebida e mencionada pela Comissão no respectivo parecer foi encarada pelo queixoso como simples comunicação da recepção do nome da pessoa responsável pelo caso.
Relativamente ao alegado desrespeito da Comissão Europeia pelas respectivas obrigações decorrentes da Convenção, o queixoso salientou que as expropriações tinham ocorrido em 1976 e não em 1975 e que, de qualquer forma, tinham continuado ao longo de vários anos, já na vigência da Convenção. Para além disso, salientou que o argumento da Comissão relativo à necessidade de esgotar todas as vias legais ao nível nacional antes de solicitar a intervenção diplomática do respectivo país não era admissível, uma vez que, em Angola, as vias legais mencionadas não se apresentavam como acessíveis.
O queixoso salientou por fim que não conseguia compreender por que motivo a Comissão Europeia recusava quaisquer responsabilidades nesta matéria, quando o Parlamento Europeu tinha declarado admissível uma petição (pet. n.° 328/98) que havia apresentado sobre o mesmo assunto em 1998.

INQUÉRITOS SUPLEMENTARES


Para poder completar as informações sobre o caso, o Provedor de Justiça solicitou ao queixoso que lhe enviasse uma cópia de todas as cartas que alegava ter enviado à Comissão e para as quais não teria recebido resposta. O queixoso enviou ao Provedor de Justiça as informações solicitadas, em 16 de Março de 2000.

O DECISÃO


Observações preliminares
Para evitar mal-entendidos, é importante recordar que o Tratado CE mandata o Provedor de Justiça Europeu para inquirir sobre possíveis situações de má administração mas apenas nos corpos das instituições da Comunidade. O estatuto do Provedor de Justiça Europeu estabelece textualmente que nenhuma acção de outra autoridade ou pessoa pode ser objecto de queixa ao Provedor de Justiça. Com base nestas disposições, os inquéritos do Provedor de Justiça orientaram-se apenas no sentido de examinar se houve alguma situação de má administração por parte da Comissão Europeia.
As alegações do queixoso contra as autoridades portuguesas não serão, portanto, estudadas pelo Provedor de Justiça.
1 Responsabilidade da Comissão
1.1 O queixoso alegou que a Comissão não cumpriu as respectivas obrigações legais que lhe incumbem por força da 4ª Convenção de Lomé.
1.2 A Comissão salientou que os eventos descritos pelo queixoso datavam de 1975, antes de Angola passar a estar vinculada pela Convenção. Existe a possibilidade de a Comunidade utilizar o artigo 5º da Convenção de Lomé IV sob certas condições, nos termos do artigo 366º-A da Convenção. Contudo, esta possibilidade não existe para acontecimentos situados em 1975, data em que Angola não estava ainda vinculada à Convenção e em que esta cláusula ainda não existia.
1.3 Durante o inquérito, verificou-se que o queixoso tinha apresentado uma petição à Comissão das Petições do Parlamento Europeu, sobre a mesma questão, em 1998. A Comissão das Petições examinou a petição em causa durante uma reunião realizada em 2 de Outubro de 1998. A petição foi declarada admissível e enviada ao organismo competente no Parlamento Europeu, ou seja, a Comissão para o Desenvolvimento e a Cooperação e a Comissão dos Assuntos Externos, da Segurança e da Política de Defesa.
1.4 O artigo 195º do Tratado que institui a Comunidade Europeia estabelece que "De acordo com a sua missão, o Provedor de Justiça procederá aos inquéritos que considere justificados (...)". Uma vez que a Comissão das Petições já debateu o caso, o Provedor de Justiça considera não ser necessário efectuar qualquer inquérito neste domínio.
2 Ausência de resposta à correspondência do queixoso
2.1 O queixoso alega que a Comissão Europeia não respondeu à sua correspondência.
2.2 A 16 de Junho de 1998, os serviços da Comissão acusaram a recepção da carta do queixoso e informaram-no de que, devido à complexidade do caso, seria necessário algum tempo para o apreciar. Nesta carta, a Comissão indicava o nome do funcionário responsável pelo caso e afirmava que o queixoso poderia contactá-lo para quaisquer explicações suplementares.
2.3 No seu parecer, a Comissão salientou que a carta do queixoso, dirigida ao Comissário Pinheiro em 18 de Março de 1998, foi objecto de resposta em 16 de Junho de 1998. Nesta carta, a Comissão explicava que, devido à sua complexidade, o caso estava ainda a ser considerado e convidou o queixoso a enviar à Comissão outras informações relevantes. A instituição afirmou que, como não se verificara qualquer reacção a esse convite, considerou-se desnecessário manter correspondência adicional com o queixoso.
2.4 Os princípios da boa conduta administrativa impõem que a administração responda adequadamente aos pedidos dos cidadãos e que os informe sobre o seguimento dado às respectivas queixas. No formulário para apresentação de queixa publicado pela Comissão no Jornal Oficial da Comunidade em 1989 ("Queixa apresentada à Comissão das Comunidades Europeias por não respeito do direito comunitário")(1), é feita referência a uma série de salvaguardas administrativas que a instituição se compromete a respeitar em benefício do queixoso. Entre estas incluem-se:
"- ser-lhe-á remetido um aviso de recepção do acto de registo da queixa,
- o queixoso será mantido informado do seguimento da queixa, designadamente das diligências realizadas junto das autoridades nacionais e das empresas implicadas,
- o queixoso será informado de qualquer processo de infracção que, em consequência da queixa, a Comissão venha a intentar contra um Estado-membro […]".
Com base nas informações em posse do Provedor de Justiça, a Comissão acusou a recepção da carta do queixoso a 16 de Junho de 1998. Contudo, parece que a instituição, apesar do conteúdo da respectiva resposta, não manteve o queixoso informado sobre os resultados do seu caso. O Provedor de Justiça considera, portanto, que esse incumprimento por parte da Comissão constitui um caso de má administração.
3 Conclusão
Com base nos inquéritos feitos pelo Provedor de Justiça Europeu relativamente a esta queixa, parece ser necessário fazer o seguinte comentário crítico:
Com base nas informações em posse do Provedor de Justiça, a Comissão acusou a recepção da carta do queixoso a 16 de Junho de 1998. Contudo, parece que a instituição, apesar do conteúdo da respectiva resposta, não manteve o queixoso informado sobre os resultados do seu caso. O Provedor de Justiça considera, portanto, que esse incumprimento por parte da Comissão constitui um caso de má administração.

Dado que este aspecto do caso diz respeito a procedimentos relacionados com acontecimentos específicos ocorridos no passado, não será adequado procurar uma resolução amigável para esta matéria. O Provedor de Justiça decide, consequentemente, encerrar o caso.
O Presidente da Comissão Europeia será também informado desta decisão.
Com os meus cumprimentos.
Jacob SÖDERMAN

(1) JO C 26, 1.02.1989, p. 7